domingo, 11 de setembro de 2011

O perna – de – pau campeão.

            No mundo do futebol sempre fui considerado como um perna – de pau, ou seja, o cara se nenhum jeito para coisa, sem estilo, sem habilidade ou domínio de bola, sem  velocidade ou força física e, para piorar eu tinha um problema na coluna que  me impedia de correr por muito tempo, ter mobilidade e sentia muitas dores, isso me deixava ainda pior.
            Tive que nascer um perna – de -  pau logo para o futebol, o esporte mais popular do país, o esporte onde a maioria dos pais querem ver seus filhos se darem bem, nasci sem nenhum jeito para o esporte que muitos sonhavam em profissionalizar – se ( inclusive eu até eu me dar conta que nem para gandula serviria).
            Senti por muito tempo o peso de ser um irremediável perna – de pau, pois, pernas – de -  pau são considerados como seres de uma casta inferior, são hostilizados, xingados, expulsos das peladas de domingo e por muito tem que se contentar mesmo em ficar de fora só olhando, ou vale apelar de vez,  comprando uma bola para obrigar os colegas a os escalar, caso contrario levaram a pelota embora, e aí, fim de partida ( agora entendo porque mamãe sempre me dava bolas novas de presente).
            Mas houve um dia em que tudo foi diferente, existia um timinho na rua da casa da minha avó, esse time era formado somente por camaradas, alguns dos meus primos, meu irmão e colegas que gostavam muito de mim, como não éramos muitos ganhei uma camisa do time, eu era o numero oito, e descobri que iria para um grande e importante jogo, mais não como titular absoluto, não como o craque ou como o goleador, eu seria o reserva. 
Enfim, chegara o dia do grande clássico: Morro da Cocada X Caminho do Manhoso, e lá estava eu sentado no banco (banco no modo de dizer) na verdade estava debaixo de uma grande árvore sentado sobre a sua raiz, era eu o reserva do grande Morro da Cocada.
            O jogo foi difícil, os meninos adversários eram maiores e o jogo era no campo deles, havia até torcida, a pressão estava grande, jogo catimbado e nervoso, até que ainda no primeiro tempo meu irmão Sandro fez o nosso primeiro gol, os caras do Caminho do Manhoso ficaram loucos, e partiram para cima, e logo empataram 1X1, que jogo dramático.
            Veio o segundo tempo e parecia que iramos tomar um coro dos caras, colocaram bola na trave, perderam um pênalti e jogavam muito melhor que nós, mais tínhamos raça e lutávamos muito para fugir da derrota, e eu tomei uma atitude, comecei a pedir para entrar na partida, gritava a todos os pulmões que queria jogar, não iria ficar na reserva, estava criando mais um problema para o nosso capitão, pois além dos problemas em campo ele tinham aquele perna  - de  - pau pedindo pra entrar.
            A torcida vendo o meu desespero começou a chiar e a reclamar (a maioria formada pelas mães dos meninos adversários) essas mães compartilhando comigo a angustia de ser reserva e estavam revoltadas pedindo para me colocar nem que fosse um pouquinho.
            Assim, aos quarenta minutos do segundo tempo ganhamos um escanteio, seria talvez a nossa última chance, o capitão pediu para meu irmão sair (meu irmão era um dos craques do time) e fez um sinal para que eu entrasse, meu irmão passou por mim e me olhou nos olhos, parti em disparada para dentro da área inimiga, me posicionei um primo meu que jogava no time adversário gritou que não precisavam se preocupar em me marcar, pois, eu era um perna – de – pau e a própria natureza se incumbiria disso.
            A bola partiu do corner direito, subiu alto e veio cair no meio da área, o zagueiro adversário tentou tirar com a cabeça, a bola resvalou nele e quicou na minha frente, ou melhor, nas minhas costas, pois estava de costas para o gol, sabe lá Deus como, eu impulsionei o corpo em uma quase bicicleta e  bati  com toda a força na bola que entrou no canto do goleiro, UM GOLAÇO!!!!!!!
Levantei todo sujo de areia e vi os amigos felizes correndo em minha direção, ao olhar para o gol a bola estava lá dentro, os adversários murmurando e o goleiro se levantando lentamente, então entendi, eu, o reserva, agora era o salvador da pátria, fui aclamado, gritaram meu nome, abraçaram – me, me deram até um refrigerante, e quando contei para o meu pai nem ele acreditou.
Mais, como alegria de pobre dura pouco, no próximo jogo eu iniciei como titular absoluto, mas, aos cinco minutos de jogo tudo voltou ao normal, chamaram meu irmão para entrar e me consolaram dizendo:  - Sergio, volta para a reserva, lá é o seu lugar. Assim acaba minha carreira meteórica no futebol.
 Mais na vida de  reserva ainda iria me acompanhar.
Era mais dia do mês de vendas, um dia estressante e difícil, onde, como se diz na gíria de vendas: “uma correria”, pois necessitava bater ainda algumas metas para melhorar meu salário, até que no final do dia meu celular tocou e meu chefe pediu para eu passar na empresa assim que terminasse o serviço, assim o fiz.
Chegando ao escritório ele me disse que a conversa seria com os gerentes, engoli seco e por um minuto pensei o pior, fiquei ali esperando um pouco e logo nos chamaram, já que não era o único (havia mais um amigo no mesmo barco que eu).
Os gerentes enfatizaram nossas qualidades, massagearam nosso ego, ressaltaram nossas honestidade e fidelidade a camisa da empresa, falaram sobre remuneração e que não tinham nada que nos desabonasse muito pelo contrario éramos acima de qualquer suspeita e após esse rodeio todo veio a noticia, eu e meu amigo estávamos na reserva.
Meu amigo engoliu seco e em seus olhos havia frustração, ele estava desconsolado e em busca de uma explicação, decepcionado, se sentindo diminuído e rebaixado a segunda classe.
Mas eu Já havia passado por isso antes, abri um sorriso. Agradeci, enchi o peito de ar e a cabeça de idéias e sai aliviado. Lá fora abracei meu amigo e tentei anima – lo, eu era o reserva mais feliz do mundo.
Reserva em nossa empresa é o vendedor que não tem rota fixa, ou seja, não tem carteira de cliente, o reserva é o cara que cobre as férias, licenças e tapa os buracos, e por muito tempo eram colocados nessa situação profissionais novos de casa, sem experiência necessária ou que eram desqualificados ou indisciplinados.
Por culpa de nossa cultura futebolística em nossa empresa os reservas eram os pernas – de pau, seres de casta inferior, péssimos profissionais, muitos colegas chegavam de canto e murmuravam algo como:  - Você de reserva? Como pode isso? Você é bom cara!
Pois é, ser reserva pode ser um problema para o ego profissional, pode ser algo desmotivador, pode nos fazer pensar que estamos em segundo plano e a um passo da porta da rua, ser reserva pode ser para muitos um atestado de perna – de pau, mais para mim não foi, sabe por quê? Porque não jogo futebol.
Isso mesmo, no mundo dos esportes o futebol de campo como chamamos no Brasil é um dos poucos esportes onde ser reserva pode transparecer falta de técnica, experiência e outras qualidades, o futebol é um dos poucos esportes que reservas parecem pernas – de pau esperando uma chance (assim como eu quando criança).
No vôlei, por exemplo, existem jogadores reservas que são preparados para condições específicas como: sacar, bloquear ou defender, eles entram fazem  o que tem que ser feito ( e muito bem por sinal) e voltam para o banco, assim é no futebol de salão, basquete e na maioria dos esportes coletivos, só no futebol de campo e na empresa que trabalho sofremos do “paradigma do perna – de pau”.
Por isso mudei de esporte, passei a olhar – me como o jogador específico, me transformei no homem que entra para levantar a bola para o atacante detonar com o adversário, virei o bloqueador dos ataques inimigos, virei o arremessador perfeito que não erra um tiro de três pontos, virei o armador que executa perfeitamente o que o técnico manda, me especializei – me em vender, negociar e atender com presteza, passei confiança para os meus colegas e superiores deixando claro com resultados que estou preparado para ajuda – los vencer.
No esporte chamado mundo corporativo a bola rola e somente os que entendem a sua posição e seu papel na partida chegam à vitória, somente aqueles que treinam até a exaustão, que tem raça e garra, somente os que têm força interior e preparo cruzam a linha de chegada e levantam o troféu.
Assim, entendi que o reserva é o que treina mais, é o cara disciplinado, focado, tem técnica apurada e tem a oportunidade de jogar com todos os companheiros.
Reservas podem passar por várias posições, por isso são privilegiados, pois aprendem a observar quando estão no banco e quando entram na partida tem a visão de alguém de fora e assim uma visão mais ampla e diretiva, reservas ficam mais tempo ao lado do técnico e quando são escalados ganharam mais que uma vaga, ganham um voto de confiança. Reservas são os que nos surpreendem.
Portanto, ser reserva não me fez um perna – de pau, me fez um craque, não me deixou pensando em desistir, muito pelo contrário, me deu mais força para ganhar a partida, os titulares que se cuidem.
 E, entendi finalmente que o que faz o profissional de sucesso não é onde ele está, mais como ele está, e eu estou preparado, em forma, e louco pra entrar em campo.
Posso ser reserva, mais a partida ainda nem começou.

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